Entrou no beco. Uma claridade sobrenatural era irradiada pela Lua. A pele já inumanamente branca daquela delicada figura angelical refletia a pálida luz, criando uma aura a sua volta que confirmava que se tratava de uma divindade.
Seus belos olhos verdes procuravam desesperados por uma rota de fuga em meio a latas de lixo, cheias, jogadas pelos cantos. Avistou, no fim da ruela sem saída, uma escada de incêndio. Precipitou-se em direção a ela, porém por mais que corresse, o seu portal de saída daquele inferno parecia não se aproximar. Quanto mais corria, mais aquele corredor putrefato se alongava, o vácuo formado engolindo toda e qualquer esperança de escapatória. Não alcançaria a escada a tempo.
Tropeçou. Seu salto de camurça azul prendeu em um buraco do pavimento irregular. Um rato guinchou, se afastando o mais rápido que pôde. Uma figura apareceu contra a luz de um solitário poste da rua. Ficou paralizada enquanto via seu assassino se aproximar lentamente. Era uma silhueta disforme que segurava um revólver reluzente. Ela se encolheu o máximo que pôde no chão frio e úmido do beco. Nada mais existia, só ela, A Sombra e um solitário rato espectador, todos imersos naquele abismo de escuridão e desespero silencioso.
Aquele era o seu fim; querendo ou não, morreria aquela noite tão solitária, naquele antro nauseabundo. Mas, estranhamente, essa ideia não a assustava. O fim trágico de uma bela jovem em um beco qualquer soava-lhe ironicamente poético. Cedeu.
O executor ergueu a arma. Mal sabia que estava prestes a criar uma mórbida obra de arte. Pronunciou o disparo. Estava feito, o corpo ainda quente da ruiva se esparramou pelo chão, e uma vez neste, pareceu que a ele sempre pertenceu. Os cabelos escarlate e o forte batom cor-de-sangue nos voluptuosos lábios garantiriam-lhe vida eterna. Suspirou o seu último sopro de vida como quem assina uma obra-prima.
O rato se aproximou para dar a primeira mordida enquanto a carne ainda não esfriava.
Aquele era o seu fim; querendo ou não, morreria aquela noite tão solitária, naquele antro nauseabundo. Mas, estranhamente, essa ideia não a assustava. O fim trágico de uma bela jovem em um beco qualquer soava-lhe ironicamente poético. Cedeu.
Clara, o crocodilo
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